Valter Lemos
LIÇÕES DAS AUTÁRQUICAS - “EM POLÍTICA A ARROGÂNCIA MATA”
Muito. se disse sobre as autárquicas. Muitos vencedores, alguns vencidos e implicações para a política nacional. Mas, eu olhei para o resultado destas autárquicas na perspetiva de análise da sua relação com a atitude dos candidatos ou das candidaturas face aos adversários e face aos eleitores.
E encontrei um ou dois traços que sublinho. O primeiro respeita à luta política e à atitude mais radical ou mais reformista dos candidatos ou das candidaturas que o suportam. Nas autárquicas os portugueses mostraram uma profunda preferência pelas alternativas reformistas tradicionais e uma recusa dos radicalismos.
Os partidos mais tradicionais arrasaram eleitoralmente, com o PS a ganhar novamente e o PSD a obter um reforço face às eleições anteriores. Os partidos mais extremistas ou radicais em Portugal foram liminarmente rejeitados nas autárquicas. Os resultados do Bloco de Esquerda são a demonstração extrema disso com a sua quase completa nulidade. Acentuou-se a indigência autárquica do BE, mostrando que o mesmo não ultrapassa a sua natureza de partido de protesto quase exclusivos de algumas elites urbanas. Por outro lado, os resultados do Chega, ao contrário do que alguma comunicação social quis alavancar, estão muito longe de mostrar uma adesão significativa aos radicalismos de extrema-direita e até a sua estrela da companhia apresentou uns resultados irrelevantes. A expressão do Chega é exclusivamente a de um pequeno partido de protesto, politicamente inconsistente e sem qualquer enraizamento local.
Praticamente todas as autarquias do país serão governadas pelos partidos tradicionais, continuando, no entanto, o declínio do PCP. Nos pequenos partidos só mesmo o mais tradicional de todos, o CDS, mantém expressão autárquica com algum significado. Mesmo a nova realidade dos “independentes”, que mostrou alguma vitalidade, está marcada genericamente, pelo menos nos casos vitoriosos, por um alinhamento sem radicalismos políticos e com um alinhamento reformista ou conservador.
Os portugueses não parecem premiar a constante fricção que caracterizou a cena política portuguesa nas primeiras duas décadas deste século e parecem recusar, pelo menos à sua porta, radicalismos e extremismos. Pode haver ainda um discurso mais inflamado nas redes sociais, que convida ao radicalismo, mas, ao escolher quem manda no seu bairro ou na sua rua, os portugueses preferem a sensatez e querem os extremismos longe da sua porta.
A outra lição que se retira dos resultados autárquicas é que “em política a arrogância mata”.
Pelo menos em alguns casos mais mediáticos, esta lição parece óbvia. O caso de Lisboa é esclarecedor. Seria manifestamente injusto acusar Fernando Medina de arrogância. Considero que Medina até foi um excelente presidente de câmara de Lisboa, mas é manifesto que o PS e Medina mostraram alguma sobranceria relativamente à candidatura de Carlos Moedas. E os lisboetas parecem não ter gostado disso. Também Rui Moreira mostrou alguma arrogância na sua recandidatura no Porto. Os portuenses não lhe retiraram a vitória, mas retiraram-lhe a maioria absoluta. E também em Castelo Branco os eleitores penalizaram a arrogância mostrada pelo movimento independente “Sempre”, com o seu discurso de vitória antecipada.
Creio que está a findar um ciclo político de aparecimento e difusão de discursos e opções radicais, muito alavancado pela expansão das redes sociais e pela influência que as mesmas tiveram na própria comunicação social. O extremismo parece estar a passar de moda e os discursos radicais sobre a sociedade e a política parecem estar a colher menos frutos.
Os anos 20 do século XXI estão a ficar diferentes das primeiras duas décadas.