Edição nº 1778 - 1 de fevereiro de 2023

Valter Lemos
A TRITURAÇÃO DOS POLÍTICOS (E DA POLÍTICA)

Na última década tem vindo a acentuar-se o processo de destruição sistemática dos políticos. A santa aliança entre a comunicação social, a chamada máquina da justiça, as redes sociais e o populismo, tem vindo alegremente a criar suspeitas, acusações, meias verdades, meias mentiras, sucessivos códigos morais, com a única finalidade de abater políticos. Os sacerdotes do sacrifício vão pregando às massas, afirmando as boas intenções da religião que os move e que é unicamente o bem comum, o interesse público e a procura da felicidade política e social.
Estamos, pois, perante uma religião, aparentemente sem um deus, mas com muitos profetas e sacerdotes, pregando a respetiva moral. As televisões e os jornais assumem alegremente o papel de inquisidores, a chamada máquina da justiça também parece gostar de assumir o papel de torturador e as redes sociais são bem as modernas turbas que precisam de sangue e sacrifícios para expurgar as frustrações que as dificuldades da vida lhes trazem.
Nesta altura já estará algum leitor a pensar que eu só estou a querer transformar os políticos em inocentes maltratados e violentados. Mas a minha preocupação não são os políticos. É a política.
A trituração dos políticos que tem vindo sempre a intensificar-se, na forma como tem sido feita pela comunicação social, a chamada máquina da justiça e as redes sociais, não tem como consequência a “purificação” dos atores, como sistematicamente nos vendem esses sacerdotes e inquisidores, mas, sim, a destruição da política enquanto atividade essencial à vida das sociedades, transformando-a numa atividade repulsiva e prejudicial.
Assim vão-se criando as condições para que – todos – os políticos sejam percecionados como pouco recomendáveis e para que qualquer cidadão se sinta inibido de se envolver na atividade política, ficando assim completo o ciclo de destruição. Como, na realidade, as sociedades não podem manter a sua existência real sem atividade política, está criado o contexto ideal para aceitar uma governação em nome da não-política. Ou seja, uma governação onde não se possa falar, agir ou até pensar.
O que se tem passado em Portugal, nos últimos tempos tem raiado a paranoia. Um exemplo recente foi que durante dias houve vários jornais televisivos que repetiram a notícia que um ministro era sócio (minoritário) de uma empresa imobiliária e que, dos diversos sócios dessa empresa havia um que havia sido condenado, anos atrás, por burla. Não era o ministro, nem sequer um familiar direto do ministro, mas um sócio, de entre outros, de uma empresa na qual o ministro tem uma quota pequena! E isto era noticiado como se o ministro tivesse cometido uma grave falta!
É evidente que os políticos têm colaborado na farsa. A ideia peregrina do inacreditável questionário prévio aos governantes é o último dos pregos colocados no caixão do enterro dos políticos. Mas está na linha da inqualificável gestão política e mediática de processos judiciais que tem vindo a ter lugar nos últimos anos. Desde o caso Sócrates que os políticos têm sido incapazes de fazer qualquer comentário desfavorável à gestão jurídico-mediática que tem sido feita dos processos que envolvem políticos. O Ministério público, o Correio da Manhã e outros órgãos de comunicação passaram a determinar quais os políticos que podem exercer funções e quando o podem fazer. E quem criticar isso é imediatamente exposto e acusado como cúmplice dos “suspeitos” ou como “outro com esqueletos no armário”.
Na realidade criou-se em Portugal um clima generalizado de suspeição, em que todos os políticos são, não só suspeitos, como culpados até prova em contrário. Tal conduz, por um lado, a um maior afastamento das pessoas do exercício de cargos políticos, com o justo receio de serem vilipendiados pelo simples facto de aceitarem exercer um cargo e, por outro lado, a uma ideia geral de que a política é, em si mesma, uma atividade suspeita.
Evidentemente que um tal clima é altamente favorável aos camaleões e aldrabões, ou sejam, aqueles que fazem política a dizer mal da mesma e dos outros políticos, para dar a ideia de que, fazendo política, não a fazem. É, sem dúvida a pior e mais batoteira forma de fazer política, mas, pelo que se tem visto, até funciona, pelo menos, para os que não querem pensar muito e para os que, motivados pela inveja social, precisam da desgraça dos poderosos ou dos famosos, para aliviar as suas frustrações pessoais ou sociais.

01/02/2023
 

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