Antonieta Garcia
MATEMÁTICA ELEITORAL
Não querem lá ver que espreita por aqui um vício de convocar eleições por dá cá aquela palha, aquele comentador? Deseja-se, é certo, uma Democracia viva, sou freguesa empenhada, não há ato eleitoral que não conte com a minha presença. Somos muitos – havemos de ser mais! – os que defendemos com unhas e dentes este regime político. Amigas do peito, ouço as que querem falar, abraço-as, somos militantes e os Direitos Humanos cumprem-se sem hesitação.
Não tenho saudades de outras formas políticas – vivi mais de vinte anos em ditadura salazarenta com um sabor a 28 de maio de 1926 - . Agora posso escolher, dizer o que penso e voto no melhor...
Tendencialmente, os “eleitos” são gente de palavra, pessoas de um só rosto, de uma só fé...
Arrepiam-me as dúvidas que se desvelam na abordagem de determinados temas, mas é humano. Há discordâncias? Acertam-se ideias, discutem-se, a Democracia ouve todos, escolhe e vence. Não é tão simples? Pois não, mas que tudo melhora comparativamente com os ditadores que deviam andar na escola antes de ditarem o que quer que fosse. (Tem-se vergonha quando intervêm políticos e dizem coisas, contam coisas que ai Jesus, valha-me Deus!?).
O cheiro a bafio sem um toque de humanidade, de doçura, o palavreado bicudo, anormalmente doente de demência avançada, a morrer devagarinho vai fugindo do quotidiano, as forças esgotam-se… Lamentamos pelo que somos, não pelo que queremos ser. As frases ficam coxas, as Assembleias dividem-se ao pormenor (são de direita, de esquerda, de extrema-direita, de extrema-esquerda, socialista, comunista, iniciativa liberal... e mais uma mão cheia de pequeninos... alguns bons. Os gráficos não enganam e o Parlamento acaba em siglas aquela colorida e comprida, arco-íris modernaço, amigos de fins de dias... E gritam com bandeiras, cartazes pouco criativos, com frases pobrezinhas, bexigosas a dizer Liberdade, Liberdade, Liberdade. Por acaso não ouvi a Fraternidade, mas com o tempo vai aparecer! Verdadeira!
Passados 50 anos, andamos nas mãos com Eduardo Lourenço, o nosso beirão sábio, a lembrar o arado e outras marcas patrimoniais que sustentam a Justiça e a Igualdade. São obras-primas que, com uma sorte dos diabos, ainda chegaram a tempo de entendermos a mudanças que queremos e não queremos...
Ainda há deuses meio loucos e políticas do arco da velha. Que nos valem. Nas Assembleias onde A ORDEM de alguns é CONCORDAR. E vemo-los personagens que dizem que “sim” e gestualmente sacodem a cabeça como reforço, tomando partido; a discórdia acena com o “não” e pouco mais comunicam do que contestam sem medo, como fazem os objetos interessantes (cabeça para trás, cabeça para a frente).”
As línguas viperinas acrescentam o gritinho e a cabeça em circo vai para trás, vira-se para a retaguarda... O pescoço já dói, mas foi eloquente a mensagem.
Podemos votar todos. Há menos de cem anos, em Portugal, nem o direito de voto era concedido às mulheres. Razões óbvias impediam o sufrágio feminino. Entre outras, o jornal Século registava em Abril de 1911: a mulher não deve votar nem ser eleitora. (...) Enquanto a política for o que é, um pântano de corrupção, um viveiro de ódios, devemos afastar do seu contágio a mimosa flor espiritual que é a mulher. (...) O objetivo era, segundo Adolfo Baptista, conservá-la no santuário do lar, esse abundante manancial de consoladoras carícias, de inefáveis e ridentes esperanças e de sãs alegrias. Ou seja, a “flor espiritual”, o “santuário do lar” era ali, naquele espaço, onde nunca jamais aconteceu violência doméstica, uma invenção de novos partidos.
Exagerava o autor? Ai, mas as palavras bonitas de morrer embriagam quem as lê. Poéticas q. b., gentis, protetoras, oferecem à mulher o lugar de excelência: o santuário do lar. Um romântico!