12 de outubro de 2016

Antonieta Garcia
Viva a República!

«Poucos períodos da nossa História foram tão “patrióticos” como aquele que a República inaugurou. O “patriotismo” fora a sua arma ideológica antes do triunfo, seria a sua justificação permanente após 1910, como se pela segunda vez (a primeira fora em 1820) os Portugueses tivessem uma Pátria, aquela mesma que em música e palavras se definira na Portuguesa, como «heróis do mar, nobre povo, nação valente».
Eduardo Lourenço, O Labirinto da saudade, Lisboa, Círculo de Leitores, 1988, p. 24.

Depois de umas bizarrias absurdas, a sagração da República voltou. Data gloriosa e inapagável, a do 5 de outubro. Já em 1143, no mesmo dia e mês, Afonso Henriques e Afonso VII assinavam, em Zamora, um tratado que marcou a paz entre o reino de Leão e Castela e o, então, reconhecido reino de Portugal. Por certo, outras efemérides aconteceram ao longo dos tempos. No contexto, acrescente-se-lhe a proclamação da República em 1910 que, em Lisboa, no ano que corre, ganhou alma. Foi visível que os principais intervenientes não se limitaram a cumprir agenda, antes celebraram o “regresso do feriado” para pensar Portugal e valores republicanos.
Pouco participadas as comemorações? O povo perdeu o pé e alheou-se há muito dos acontecimentos que mudaram Portugal. Quem promove o esquecimento? A memória do passado é vital, porque “Um povo que não alimente as suas lendas está condenado a morrer de frio”; apagar o património, a História desenraíza o ser, aliena.
Ora, há 106 anos, às nove da manhã, do dia 5 de outubro, na varanda da Câmara de Lisboa, foi proclamada a República Portuguesa. O país entrava num novo período. Os sonhadores antecipavam promessas, criavam uma maré de esperança e uma vertigem que autorizavam a maior fé na humana condição.
A aceitação, a simpatia que a República granjeou fora de tal modo surpreendente, que perpetuou a frase de João Chagas, quando afirmou que “ela se proclamara em Lisboa pelas armas e se fizera no resto do país pelo telégrafo!”
Eduardo Schwalbach mostra outro ângulo: “E o mundo elegante? Este dispersou-se com o advento da República: uma parte levantou voo; a outra só mais tarde voltou às suas travessuras mas embiocada para não dar nas vistas.”
Confessará, porém, Rolão Preto: A partir da implantação da República, em 1910, sempre nós, monárquicos, conspirámos contra esse regime e sempre os republicanos mostraram o seu esquecimento para as nossas goradas aventuras. Monárquico, não me custa nada confessar a grande generosidade com que os republicanos se houveram, tantas vezes, com os seus adversários vencidos.”
O governo fora entregue a uma elite crente no axioma do progresso contínuo. Com confiança no futuro idealizou reformar as mentalidades, modernizar, melhorar as condições de vida, emancipar as mulheres, proteger a família, fomentar o desporto, a saúde, melhorar as condições de vida, defender a secularização da vida pública, ampliar a educação. Seguiam as novas Tábuas sagradas de uma lei nova, em que radicava um projeto de transformação da Humanidade.
Na verdade, a instrução pública era uma desonra nacional: dois terços dos portugueses não sabiam ler ou escrever. Em 1910, o país contava com 32 liceus, frequentados por 7767 homens e 924 mulheres. Na única Universidade do país, em Coimbra, estudavam 1207 alunos e 5 alunas. Não existia ensino técnico. O analfabetismo atingia 70% da população com mais de 7 anos.
Portugal com cerca de 6 milhões de habitantes importava a maior parte dos produtos de que carecia, a carga dos impostos era enorme. Equilibrar as Finanças tornou-se um dos objetivos de republicanos. Porém, a eclosão da I Guerra, em 1914, as despesas com as expedições às colónias, com a participação na contenda, na Europa, aliadas à necessidade de reorganização do Exército, e à crise internacional obrigaram a adiar anseios. Ainda assim, entre 1910 e 1926, segundo António Reis, “foram construídas mil cento e cinco escolas primárias em diferentes concelhos do país; reduziu-se o analfabetismo em 7%;a população estudantil de ensino secundário aumentou, embora só se tenha construído mais um liceu; reformaram-se e melhoraram-se as escolas de formação de professores primários, às quais se deu o nome de Escolas Normais Superiores; a Universidade de Coimbra foi modernizada e logo em 1911 criaram-se as Universidades de Lisboa e do Porto”.
A contrarrevolução monárquica, iniciada após o cinco de outubro, considerava que a República era um regime sem autoridade, sem disciplina, sem ordem. Todavia, uma quota-parte significativa de responsabilidade da agitação que se vivia, em Portugal, cabia aos monárquicos. Entre o começo da Guerra (agosto de 1914) e a revolução chefiada por Sidónio Pais, não cessaram as ações subversivas para derrubar a República. A I Guerra foi, escreveu Edgar Morin, o “ciclone histórico”. A pneumónica agudizaria as dificuldades com as 102.750 vítimas; as reformas adiaram-se, a miséria aumentou.
Mas, na voz de Eduardo Lourenço: “Este Portugal dos fins do século XIX, princípios do XX, medíocre, mendigo político da Europa, assistirá estupefacto e incrédulo a uma operação de magia poética incomparável destinada a subtraí-lo para sempre àquele complexo de inferioridade anímico que a geração de 70 ilustrara com tão negra e fulgurante verve.”
Em 16 anos que fez a República? Alargou a escolaridade, o acesso à saúde, o saneamento público, a proteção à família, a segurança no trabalho. O dogma do progresso através da escola, templo e fórum de um povo livre, escorava a bandeira maior da República.
Gago Coutinho e Sacadura Cabral levantaram o ânimo de patriotas que os identificavam como os novos heróis.
E vá lá saber-se que mão providencial garantiu a nomeação, a 5 de outubro, de um homem inteligente e bom, português com raízes na Beira, para o cargo de Secretário-Geral das Nações Unidas! Faltava-nos o Engenheiro António Guterres para elevar a alma portuguesa! Como pode suprimir-se a celebração de uma data com tão boas memórias?!

12/10/2016
 

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