27 de junho de 2018

Fernando Dias
OLEIROS - A ver passar os aviões…

Eu era rapazito quando conheci uma aldeia da freguesia da Amieira, no concelho de Oleiros.
Calhou olhar o céu e comentei os rastos dos aviões. Logo, um habitante dessa aldeia esclareceu: “Aqui passam muitos aviões!”, querendo, assim, dar-me um exemplo do progresso da sua terra.
Passaram-se décadas. A aldeia continua lá, agora mais calada e triste e com muito pouca gente nas ruas e nas hortas. A escola, a loja e a igreja fecharam. O habitante mais novo tem sessenta anos. (a)
Já não passa o autocarro mas, felizmente, continuam a passar os aviões.
Alguém me disse que passava aqui uma rota de aviação, ligando Lisboa a outras grandes cidades europeias. Pareceu-me bom que, ao menos nas rotas aéreas, estivéssemos no mapa.
Naquelas décadas, quase nada de bom aconteceu por cá.
Os empregos, as escolas, as fábricas, os médicos, os serviços, as autoestradas, o progresso enfim, foram chamando os nossos conterrâneos e atulhando o litoral. A faixa de Setúbal a Braga, engordou à custa do interior.
Também algumas cidades do interior cresceram à custa dos concelhos próximos e algumas vilas mantiveram-se ativas à custa das aldeias vizinhas.
Agora, dizem que vai mudar, que a aposta é no interior.
Desconfio das campanhas muito ruidosas, muito vistosas, abertas e celebradas com pompa e circunstância, nas quais ficamos empanturrados de promessas e de boas intenções. Temos vários exemplos disto na nossa história recente, com resultados fracos ou invisíveis.
Acredito nas boas intenções de quem defende a aposta no interior. Duvido, isso sim, da eficácia das medidas, por causa dos critérios na sua aplicação. Seria lamentável que se esbanjassem milhões neste interior imenso, satisfazendo o ego de meia dúzia de privilegiados, fazendo nascer novas “Lisboas”, à custa, mais uma vez, dos concelhos mais isolados.
Não sendo possível uma fábrica e um conjunto de serviços públicos em cada freguesia, a aposta deve ser no desenvolvimento da capacidade produtiva e na melhoria de TODOS os serviços públicos de cada concelho. Só assim se manterá vivo todo o território nacional.
Há que investir mais nas potencialidades de cada território, que são muitas e diversificadas e na melhoria urgente das ligações rodoviárias às cidades mais próximas.
Atentemos o caso de Oleiros. Temos tanta floresta para ordenar e rentabilizar, tanto território para reflorestar e para criar gado, tantas paisagens para explorar, tão bons produtos para valorizar, tanto para produzir, tanto para transformar e ainda tanto por fazer. O “empregozinho” não basta nem chega para todos. A prioridade do município deve ser incentivar mais, apoiar mais quem quer investir e produzir. Na falta de grandes unidades industriais com muitos postos de trabalho, talvez a opção correta seja a criação de dezenas de pequenas empresas. Os queijos, as compotas, a doçaria, o leite e a carne de caprinos, o artesanato, os enchidos, as bebidas, a restauração, parecem-me ser áreas com enorme potencial de crescimento, se a aposta for na qualidade e genuinidade.
Ao mesmo tempo, o que podemos esperar de uma estrada com sessenta quilómetros, duzentas e cinquenta curvas e uma hora de viagem para chegar a Castelo Branco? E da outra, parecida com esta em direção ao Fundão e à Covilhã? Imaginem umas vias semelhantes à que agora nos liga à Sertã e ficaríamos apenas a meia hora de cada cidade. Era logo ali e seria tudo diferente. Dizem agora que tudo vai mudar, Que a aposta é no interior. Pode ser desta, se não ficarmos satisfeitos com a “música” e se, no nosso concelho, soubermos valorizar o que temos e reclamar o que nos é devido. Se não o fizermos, ninguém o fará por nós.
Não o fazendo, continuaremos a “dar” gente às cidades, cada vez menos, porque somos cada vez menos.
Naquela tal aldeia que eu visitei e nas outras quase todas deste concelho, não vai ficar ninguém, nem sequer para ver passar os aviões…

(a) (O índice de envelhecimento em 2016 foi de 149% em Portugal, 275% na Beira Baixa e 607% no concelho de Oleiros. É um problema grave em Portugal, é uma preocupação em toda a Europa e é uma situação dramática no concelho de Oleiros)

27/06/2018
 

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