Valter Lemos
ANDAM A GOZAR CONNOSCO! (OU) CALEM-SE E FAÇAM ALGUMA COISA!
O atual Governo quando iniciou funções fez juras pelo interior. Criou, aliás, uma Unidade de Missão para o desenvolvimento do interior. A primeira coordenadora dessa unidade demitiu-se, mas, foi nomeado um novo coordenador, que até é do interior e foi autarca nestas terras (Proença-a-Nova).
Há algum tempo a unidade apresentou um relatório propondo cento e sessenta (!!!) medidas.
Alguém se lembra dessas medidas? Alguém sabe quais foram aplicadas?
Depois vieram os horrendos e catastróficos fogos. Morreram centenas de pessoas e ficou à vista o desprezo de décadas dos poderes político e económico e o estado catatónico do Estado no respeitante à administração do território e à defesa das populações.
Nova inundação de declarações políticas, agora, não só do governo, mas também de todos os partidos da oposição e, claro, do Presidente da República. Juras de solidariedade e de fidelidade dos líderes políticos e novo chorrilho de intenções e de putativas medidas para o interior e finalmente alguma utilidade prática para a Unidade de Missão para o interior no apoio à reconstrução de casas e outras estruturas.
Para além dos auxílios para essa reconstrução (era o mínimo exigível) alguém se recorda de mais algumas medidas tomadas para o desenvolvimento económico, ou mesmo tão só o povoamento do interior?
Depois veio “a sociedade civil”. Um movimento para a defesa do interior. Diversos autarcas, académicos, empresários e políticos na reserva ou na reforma. Curiosamente o distrito de Castelo Branco quase não estava representado em tal movimento liderado pelos autarcas da Guarda e de Vila Real. Nova enxurrada de propostas. Novas declarações de solidariedade política do Presidente, do governo e dos partidos.
Alguém viu alguma concretização? Alguma medida concreta aplicada?
Devo dizer que já não consigo aturar ou sequer ouvir o Marcelo, o Costa, os ministros ou outros líderes políticos a falar do interior. Dá vontade de dizer uma asneira. Por favor tenham algum respeito por nós, calem-se e como dizia no paredão do Alqueva, façam alguma coisa, porra!
Todos sabemos que o que há a fazer não são muitas coisas e por isso não são precisos documentos com centenas de medidas, que constituem somente uma forma de criar poeira e esconder as coisas verdadeiramente importantes.
(Parece aliás que andam a gozar connosco. Veja-se o caso do IC 31. Há pouco tempo recebi colegas que se deslocaram de Barcelona para Castelo Branco de carro. Atravessaram toda a Espanha em autoestrada e não pagaram uma portagem, até chegarem a Moraleja. Aí subitamente a autoestrada terminou numa… rotunda! Depois fizeram duas dezenas de quilómetros em estradas municipais até entrarem em Portugal e seguidamente setenta quilómetros em estrada nacional portuguesa, com tantas curvas que pensaram que se tinham perdido! Como explicar a quem atravessa a Espanha em autoestradas sem portagens que a sua autoestrada termina numa rotunda e não continua até Portugal e as dezenas de quilómetros antes de Castelo Branco são assim porque os políticos portugueses acham que temos autoestradas a mais e não quiseram fazer a ligação?)
A concretização de medidas de harmonização territorial do país parece mesmo ser inversamente proporcional à diarreia verbal sobre o interior dos representantes partidários e governativos. Poder-se-á dizer que a questão tem largas dezenas de anos e que não se altera repentinamente, mas, na verdade, já houve governos que tomaram, excecionalmente, algumas decisões com verdadeiro impacto (Alqueva, A23, Túnel do Marão, Rede de gás natural, etc.) ainda que não suficientes. Mas o atual e constante adiamento de medidas com verdadeiro significado para a efetiva solução do problema continua, apesar da cortina de declarações políticas.
Há alguma grande obra pública prevista para o interior do país? Há alguma negociação séria para a instalação de grandes empresas nas cidades ou vilas dos distritos da faixa raiana? Há algum plano para a criação de algum polo de excelência científica e técnica de nível internacional em politécnicos ou universidades desses distritos? Há alguma política séria de incentivo à mobilidade de jovens para esses territórios? Apesar da verborreia política não há nada disto nem de quaisquer outras medidas verdadeiramente impactantes.
Aproximando-se eleições vamos assistir ao aparecimento de programas eleitorais com diversos parágrafos de escrita redonda onde a palavra interior e os diversos sinónimos e derivados aparecerá copiosamente. Mas, o que realmente importa são os compromissos concretos e objetivos. Por isso talvez seja mesmo a altura de dizer aos partidos que só votamos neles se tais compromissos forem inequivocamente assumidos.