Edição nº 1704 - 25 de agosto de 2021

Elsa Ligeiro
TODOS OS SONHOS DO MUNDO NUMA BIBLIOTECA

Os leitores são o coração de uma Biblioteca.
Não importa que ela seja privada, escolar ou do município; uma Biblioteca deve ser cada vez mais um lugar de desenvolvimento social; e acolher a permanente investigação de como habitar o mundo em comunidade.
Há um paradigma que tem que ser alterado, melhorado.
Desde logo porque a ciência e a tecnologia nos permitem o armazenamento de memória com um horizonte quase infinito, papel reservado durante séculos apenas à Biblioteca.
A Biblioteca serviu durante milénios para juntar e proteger, num mesmo espaço, saberes relevantes que necessitavam de proteção à pilhagem de memórias e identidades
Um invasor tinha (terá ainda?) como prioridade queimar bibliotecas; pela certeza de que ali residia o que é mais difícil de combater, a resistência à domesticação através da Cultura.
Se frequentarmos uma Biblioteca bem organizada, por mais pequena que seja, teremos a consciência plena que vivemos um século de ouro de liberdade e bem-estar.
Pelo menos no Ocidente, com uma tecnologia que diariamente nos surpreende; com uma resposta científica rápida em casos difíceis, como é o de uma pandemia.
Organizámo-nos de modo a excluir a guerra do confronto físico e de extermínio massivo, numa Europa na qual apenas há menos de uma vida (80 anos) existiam campos de extermínio e ocupações militares.
Uma das imagens mais marcantes dessa época é ainda a queima pública de livros numa tentativa de eliminar a História.
É ainda possível queimar ou simplesmente abandonar todos os livros de uma Biblioteca; o que nunca será possível é eliminar a força de um leitor esclarecido; a sua capacidade para criar uma comunidade de partilha e ser um pilar na construção de uma nova biblioteca.
Poderá até ser eletrónica; independentemente do seu suporte em “papel”, terá a mesma eficácia: partilhar dados ancestrais, um legado de séculos que permanecem como pegadas dos nossos antepassados. Como o são os monumentos históricos.
Imagino o riso dos futuros habitantes deste condado portugalense, com as suas praças; e as suas placas a registarem inaugurações às dezenas; em municípios com poucos milhares de habitantes; em que uma obra de requalificação merece uma placa em material nobre, quando não gravado em pedra, do nome do presidente do município no cargo; que, como sabemos, em democracia, é sempre reduzido e a prazo.
Todo o poder real se manifesta através do simbólico; o fraco através do ridículo. Os livros contam-nos a vida de centenas de heróis de “pés de barro” que não sobreviveram a uma geração.
Mas uma Biblioteca também é um lugar em que o poder tem a tentação de manifestar-se; veja-se, por exemplo, a escolha das frases que decoram as paredes da Biblioteca Municipal de Castelo Branco; e a falta de conhecimento literário de quem as escolheu.
Quem será o/a responsável?
O funcionalismo público, e, sobretudo, o que é eleito em democracia; devia ter responsabilidade e nome; para além das placas de inaugurações e de requalificação de jardins.
Talvez uma democracia adulta se revele aos eleitores no conhecimento do/a responsável pela escolha das frases que ilustram as paredes de uma Biblioteca Municipal.
Porque uma Biblioteca é um lugar privilegiado de cidadania; em que os leitores são a sua grande riqueza; sem um leitor, o livro não passa de “papel pintado com tinta” como escreveu Fernando Pessoa, no poema Liberdade.
Uma biblioteca que não cultiva leitores, que se limita à sua função de guarda-livros é uma Biblioteca condenada ao desa-parecimento.
E uma tragédia, para toda e qualquer Humanidade, porque numa Biblioteca vivem (ainda) todas as suas realizações; e todos os sonhos do mundo.

25/08/2021
 

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