4 junho 2014

Guilherme D'Oliveira Martins
VASCO GRAÇA MOURA, UM GRANDE AMIGO

O Porto perdeu um dos seus símbolos. Portugal fica com uma referência essencial. Vasco Graça Moura foi incansável na defesa da cultura portuguesa. Sou testemunha do seu trabalho constante. Tinha qualidades de trabalho extraordinárias, únicas e punha-as ao serviço do seu enorme talento. Aproveitava todos os momentos para dar-se à criação de poeta, de ensaísta, de escritor.
É um grande amigo que perco, que conheço há cerca de quarenta anos e com quem tive sempre uma relação de admiração e estima pessoal. Membro ativo do Centro Nacional de Cultura deixa-nos um lugar insubstituível. Sempre nos encontrámos numa ligação muito próxima e de confiança mútua. É uma das grandes referências da cultura portuguesa contemporânea. O Vasco era de uma inteligência viva, acutilante, claríssima e determinada. Não podemos esquecer o poeta e o ensaísta dotadíssimos.
Foi um escritor de todos os ofícios e sempre com elevadíssima qualidade e sensibilidade, capaz de abranger de um modo amplo e compreensivo, a identidade portuguesa e a sua ligação universal desde os clássicos aos modernos. O recente ensaio sobre as identidades europeia e portuguesa é de uma grande lucidez e pertinência, devendo constituir um motivo sério e obrigatório de reflexão. Tivemos oportunidade de debater o tema e concordo plenamente com as suas preocupações e conclusões.
Era um humanista dos tempos de hoje - frontal, corajoso, empenhado. Eduardo Lourenço teve razão em referir que a sua poesia é fiel à melhor herança do nosso épico. Não podemos compreender a leitura moderna de Camões sem o contributo de Vasco Graça Moura - daí que a sua versão fidelíssima de «Os Lusíadas» para os jovens seja fundamental quer nos domínios cultural e literário, quer pedagogicamente.
Como tradutor, basta lembrarmo-nos de «A Divina Comédia» de Dante e de toda uma obra inultrapassável. Os maiores especialistas do grande poeta florentino são unânimes em reconhecer a fidelidade de Vasco ao sentido fundamental dessa obra-prima da literatura mundial. Poucos portugueses atingiram esse nível de respeito geral na defesa das Humanidades. Foi, nesse sentido, um espírito do Renascimento nos nossos dias - e nunca o esqueceremos por isso. E não esqueço a passagem relevantíssima na Televisão, na Imprensa Nacional, na Comissão dos Descobrimentos, no Parlamento Europeu, no Centro Cultural de Belém.
Das últimas conversas que tivemos, devo recordar uma preocupação constante relativamente ao culto das Humanidades. Estávamos de acordo com o empobrecimento cultural nas sociedades contemporâneas e em especial da escola. Se é verdade que os melhores hoje têm qualidade superior aos melhores de há quarenta anos, não é menos certo que tem havido empobrecimento nos níveis médios, com perigoso esquecimento dos clássicos. Vasco Graça Moura, quando realizou a referida edição de «Os Lusíadas» para os mais jovens, contribuiu decisivamente para colmatar esse vazio – devendo hoje os educadores compreender que têm de ser mais exigentes no desenvolvimento das atividades de aprendizagem ligadas às raízes culturais e ao melhor que foi produzido, ao longo da história, na língua e na literatura. Se a aprendizagem de qualidade para todos é a marca fundamental do desenvolvimento, não podemos esquecer que esta exige trabalho, memória, leitura direta dos textos fundamentais, capacidade de dizer de cor e de usar a vitalidade do melhor uso do idioma. E nesse diálogo, que nunca esquecerei, o meu Amigo Vasco sempre soube ligar as Humanidades literárias à ciência – como ficou claríssimo quando na Comissão dos Descobrimentos nos legou um testemunho vivo da capacidade inovadora científica e técnica, literária e filosófica do tempo áureo da história portuguesa. Leia-se a revista «Oceanos» e facilmente verificamos que aí está uma insuperável Enciclopédia sobre a gesta portuguesa no mundo – pela afirmação do humanismo universalista, que Jaime Cortesão tão bem soube interpretar e Eduardo Lourenço tem sabido enriquecer magnificamente.
Não há palavras neste momento. Apenas o silêncio de uma sentida homenagem a um dos nomes maiores da cultura portuguesa.

04/06/2014
 

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