Edição nº 1647 - 15 de julho de 2020

Lopes Marcelo
DE CRISE EM CRISE

Na reflexão partilhada com os leitores de que os problemas sociais e económicos andam todos ligados e que tudo vai desaguar na economia e nas crises financeiras que, ciclicamente se descontrolam, já sublinhámos que a criação e concentração de moeda nem sempre corresponde à criação de riqueza de bens e serviços úteis e, muito menos, a uma distribuição justa entre os factores e os meios de produção.
Na engrenagem multiplicativa da criação e de acumulação de capital, o dinheiro foi-se desligando da produção de mercadorias e bens e serviços, tornado-se ele próprio mercadoria especialmente negociável, cada vez mais já não constituindo fluxos reais mas, antes , meros registos difusos e especulativos que jogam com a confiança dos consumidores nos mercados e nas instituições financeiras.
A agregação de capitais em Fundos de capitais privados ditos de investimento e em Fundos públicos designados por Fundos soberanos, constituem duas modalidades de capitalismo até dito democrático porque abertos à massificação das fontes de capital, mas que de funcionamento justo e democrático nada têm. De facto, nos Fundos privados abertos, pequenas e grandes poupanças são concentradas nas mãos de gestores profissionais muito bem pagos e disputados como se de treinadores de futebol se tratasse e cujo trabalho é fazer aplicações em qualquer parte do mundo onde mais lucros obtenham, muitas vezes sem atender ao risco, ao enquadramento legal e à sustentabilidade e, até, preferindo activos tóxicos. Quanto aos Fundos soberanos, de propriedade e gestão estatal, são utilizados na estratégia de domínio económico e geo-estratégico por governos de diferentes correntes e cosméticas ideológicas, como ferramenta de poder económico e de domínio de grandes empresas no designado capitalismo monopolista de Estado.
Por activos tóxicos, entendem-se as aplicações em investimentos de grande risco que não foram devidamente ponderados ou que resultaram de negociatas obscuras, servindo interesses especulativos e particulares não explicitos e não decorrentes do são funcionamento da economia. Correspondem a registos contabilitícos no activo de empresas, muitas vezes nos Bancos, em valores financeiros irreais e até falsos, registados e mantidos por valores muito acima do valor real.
Os registos constantes dos Activos dos Balanços dos Bancos correspondem a registos no Passivo dos Balanços das empresas suas clientes devedoras. Se as empresas entram em falência e não cumprem com o pagamento das dívidas, o valor de tais activos que foram dados em garantia aos Bancos, tornam-se cada vez mais tóxicos, mais irreais, a valer cada vez menos, comprometendo a estabilidade financeira da instituição bancária. Uma das crises derivadas de activos tóxicos, originou-se no sector imobiliário, teve origem nos Estados Unidos, foi designada por “subprime” que se foi alargando como mancha de óleo através do funcionamento do mercado. De facto, verificou-se a generalização de empréstimos hipotecários em que os bancos disponibilizaram capitais a juro muito reduzido já que existiam subsídios do Governo e em valor superior aos das casas, em concorrência consumista desenfreada. As famílias endividaram-se muito acima das suas possibilidades e, deixando de pagar as dívidas, os Bancos e as empresas imobiliárias ficaram com as casas que passaram a vender no mercado em grande número, contribuindo para lhes baixar ainda mais o preço real. A diferença crescente entre o valor registado no Activo dos Bancos e o valor real das transações e a falência das empresas imobiliárias, tornou cada vez mais tóxicos tais activos. Sem regulação, pelo funcionamento descontrolado do mercado, a crise estendeu-se à Bolsa e como os passivos (dívidas) de umas empresas constituem os activos (bens patrimoniais e expectativa de receitas) de outras empresas, estando tudo ligado, o efeito de dominó ou de mancha de óleo desencadeou-se por todo o mundo capitalista. Mais uma vez, as famílias remediadas e mais pobres, mais pobres ficaram e, com o grande desemprego que se originou, mais se acentuou a injusta repartição da riqueza.

15/07/2020
 

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