Edição nº 1651 - 12 de agosto de 2020

Elsa Ligeiro
LIVROS PARA O MÊS DE AGOSTO

É normal que depois de meses de quarentena e um desconfinamento que custa a terminar, todos desejem o cume da Serra da Estrela para respirar ar puro, sem medos nem condicionamentos.
Umas férias sem livros deve ser a opção de muitos, mas para quem viver é uma interrogação e um desafio permanente sei que não sairão de casa sem dois ou três livros na mala. Para esses, aqui ficam três sugestões:
“Tentações – Ensaio sobre Sade e Raul Brandão”, de Pedro Eiras,
é um livro-prefácio que convoca dois autores para um diálogo que muitos julgarão impossível: Raul Brandão e o Marquês de Sade.
No entanto, Pedro Eiras prova, com inúmeras citações de Raul Brandão, que há muito mais Sade em Raul Brandão do que se possa imaginar.
“Tentações” é um livro da já desaparecida editora Deriva que vale a pena procurar e Ler.
Para quem tem crianças em casa, recomendo o livro de Ana Cristina Pessoa Tavares: “A alga que queria ser flor”.
Um livro que nasce de um trabalho didático para explicar a evolução e o maravilhoso mundo das plantas aos mais pequenos.
A edição do livro é da Imprensa da Universidade de Coimbra e as ilustrações são de Joana Barata.
E deixo como proposta final um dos romances mais extraordinários de Agustina Bessa-Luís: “O Sermão do Fogo”, reeditado em setembro de 2019, pela Relógio d’Água; e que ao contrário dos outros livros de Agustina nesta editora surge sem Prefácio de um outro autor conhecido.
A editora recupera um texto da “Brotéria” assinado pelo Padre Manuel Antunes, que coloca na contracapa; e que situa o livro numa dimensão filosófica. “Contra tudo que artificializa o homem, contra a técnica e a civilização, contra as ideologias e contra as mentiras e os slogans e as propagandas, a Autora ergue a sua voz.
Uma voz antiquíssima, do princípio do mundo, apelando para a conaturalidade dos seres, para o seu enraizamento na terra, para a sua esperança infatigável, sempre renascente dos escombros, para o amor que sabe acreditar e que sabe confiar”, escreve o Padre Manuel Antunes, nascido no concelho da Sertã.
E a protagonista do livro, Amélia, é descrita pela autora do seguinte modo: “Era uma mulher como ela que os homens gostam de ter disponível, porque lhe faz acreditar num mundo em que sempre são profanos, pois ninguém pode ao mesmo tempo competir e amar, ter uma profissão e existir. Quem era Amélia? …Uma mulher que a idade ia tornando quase corpulenta, com essa tez fina e ainda transparente própria da virtude premeditada; ia cumprir sessenta anos, e peço aqui que compreendam esta preferência por uma personagem que não interessa insistentemente senão ao seu dentista, mas, antes do meio século, meus amigos, ninguém tem história…”
Ou, como bem observa no seu comentário o Padre Manuel Antunes:
Agustina Bessa-Luís converte-se neste livro (de 1962), em “sibila”, uma sibila que tem o nome de Amélia, e anuncia, mais além do tempo dividido e superficial – , o tempo dominado, por exemplo, pela “arte, a política e o dinheiro, a violência” –, o tempo “sem separação”, o tempo da liberdade…”
“O Sermão do Fogo” é um dos mais pessoalíssimos livros de Agustina Bessa-Luís, que como toda a sua obra não é para passar o tempo, mas para compreender o nosso tempo comum e o reconhecimento que a vida é um acontecimento extraordinário.
Mas, digo eu, a literatura, os livros; não são a salvação para nenhum dos nossos problemas, são apenas um espaço de reflexão e de encontro fraterno num território de ninguém, onde todos podemos especular até à exaustão sem correr nenhum perigo.
Uma espécie de jogo de xadrez; em que, se ganhe ou se perca no jogo; o resultado será sempre uma vitória: uma agilidade mental que mais cedo ou mais tarde utilizaremos na nossa vida prática e útil.
Boas férias e Boas leituras.

12/08/2020
 

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