Edição nº 1894 - 7 de maio de 2025

Valter Lemos
O PAPA E A EXTREMA-DIREITA

Quase sempre os partidos e os políticos de extrema-direita se mostram muito religiosos ou fazem alarde da sua fé. Sejam católicos, ortodoxos ou evangélicos os políticos de extrema-direita usam frequentemente a sua fé ou a sua religiosidade como instrumento de ação política.
A verdade é que ao longo da história as igrejas têm frequentemente, também, apoiado ou incentivado líderes e regimes extremistas. O apoio da Igreja Católica a regimes como as ditaduras de Salazar ou de Franco são exemplo disso, mas nos tempos atuais o apoio incondicional da igreja ortodoxa russa a Putin, ou o apoio das igrejas evangélicas a Trump e a Bolsonaro também são exemplos claros.
Não foi o caso do papa Francisco.
Francisco foi um claro opositor da extrema-direita e expressou-o de forma inequívoca. Por isso os líderes dos partidos e movimentos sempre mostraram o seu desagrado pela oposição que o papa mostrou às ideias xenófobas e racistas desses partidos.
A frase de Francisco sobre a construção de muros levou Trump e outros membros da sua administração a criticar acidamente o Papa. Marine Le Pen mandou-o cuidar das igrejas. O fascista Salvini apupou-o várias vezes nos seus comícios e em mensagens políticas. Milei, seu conterrâneo, chamou-lhe “representante do maligno na terra”, “imbecil” e “filho de puta que prega o comunismo”, entre outras bestialidades.
E, também o seminarista André Ventura o acusou de “prestar um mau serviço ao cristianismo”.
Mas, realmente as ideias centrais da extrema-direita atual são inconciliáveis com o cristianismo de Francisco. O papa defende os mais fracos: os pobres, os excluídos, os emigrantes, os refugiados. A extrema-direita faz desses os seus alvos privilegiados de ataque. O papa defende a tolerância, a extrema-direita defende a intolerância. O papa critica a sacralização do dinheiro e o capitalismo selvagem, a extrema-direita defende os ultra-ricos e a desregulação do mercado. O papa defende a luta contra as alterações climáticas e o equilíbrio ambiental, a extrema-direita nega as alterações climáticas e defende a degradação ambiental e a exploração sem regras do planeta. O papa defende o amor como sentimento primeiro e a extrema-direita defende o ódio.
Nestas primeiras décadas do século XXI, Francisco foi uma das poucas vozes defensoras da condição humana que se conseguiu fazer ouvir no meio da estridência e do histerismo que assaltou o mundo. A lucidez, a humildade, a bondade e a serenidade de Francisco foram os mais importantes e fortes contrapontos à maldade, ao obscurantismo e à histeria política da extrema-direita.
A morte do Papa Francisco é, pois, um momento muito importante. O seu legado precisa de ser mantido e desenvolvido. Tem havido um enorme esforço da extrema-direita para tentar influenciar a sucessão de Francisco. Nos EUA uma organização ligada a ex-assessores de Trump, o Red Hat Report, tem vindo a tentar desacreditar, no espaço mediático cardeais mais reformistas seguidores de Francisco e a promover a imagem de cardeais conservadores mais apoiantes das políticas de Trump e da extrema-direita.
O mundo precisa da continuação do papado de Jorge Bergoglio. Esperemos que tal aconteça.

07/05/2025
 

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