Celeste Capelo
Bem! estamos safos
Terá sido provavelmente esta a frase pronunciada pelos responsáveis da PT quando, a tempo e horas, conseguiram recuperar, ou melhor pôr a salvo os seus investimentos no Grupo Espírito Santo. Outros não o puderam fazer, pois não tiveram a informação privilegiada que, tudo indica ter tido a PT, o que levou o Sr. Ministro da Economia a classificar esta situação como, e cito: “desfaçatez da PT”.
Parece-me esta atitude, coadjuvada com a posição tomada pelo Sr. Primeiro Ministro, um sinal claro de ruptura com os velhos hábitos políticos.
Se nos reportarmos ao que aconteceu com o BPN, e recordando a solução então encontrada, podemos ver a diferença. Penosa, é certo, qualquer uma delas, no entanto a que foi encontrada pelo actual Governador do Banco de Portugal e certamente com a aprovação do Governo, é bem diferente e bem mais justa em termos de justiça social, pois foram salvaguardadas as poupanças de milhares de cidadãos que não utilizam a fórmula “gaste agora e pague depois” .
No entanto adensam-se algumas dúvidas que aumentam a minha preocupação. Li em alguns jornais declarações de pessoas que, muito mais eruditas e bem informadas que eu, proferiram. Lembro por exemplo João César da Neves a propósito de uma interrogação também por ele formulada, e cito: “Será Portugal um país desenvolvido, rico, civilizado? …Os recentes episódios que revelam a teia de poder à volta do Grupo Espírito Santo (GES) justificam que se pergunte se estaremos no Terceiro Mundo…”;”…. Portugal é sem dúvida um país civilizado. O único problema está nas elites, que frequentemente nos arrastam para o Terceiro Mundo”.
Aqui interrogo-me: Serão as elites corruptas? E volto a citar João César da Neves: “Olhando para a última década constato que se respira em Portugal um clima de compadrio, maquinação e cabala ao mais alto nível, que cresceu silenciosa mas inexoravelmente. Os anos Sócrates manifestaram-no a vários níveis: nos escândalos bancários, por exemplo, além de irregularidades financeiras, sentiram-se intrigas palacianas vastas, profundas e complexas, sobretudo no BCP, que são alheias a uma sociedade equilibrada”.
No que à justiça diz respeito, mais inquieta fico, ao ler excertos de declarações proferidas por pessoas que regularmente leio e/ou escuto.
Por exemplo:
? Martim Avillez Figueiredo: “A justiça tende a actuar apenas depois de se assegurar que os poderosos agonizam no chão.”
? Pedro Adão e Silva: “A justiça, em Portugal, só chega aos poderosos quando estes já perderam a sua influência social ou o seu poder político.”
? Daniel Oliveira: “Foi preciso Salgado passar para o lado dos fracos para ser possível esta detenção de necessidade duvidosa”.
? Luís Marques Mendes: “Se ainda fosse presidente do Banco Espírito Santo, será que Ricardo Salgado teria sido detido pelo Ministério Público?”
Deixaram-me ainda perplexa as palavras de José Sócrates no seu habitual comentário ao domingo na RTP1, onde se colocou fervorosamente ao lado de Ricardo Salgado, manifestando grande estranheza pela sua detenção.
Tudo isto somado, e organizando as peças do puzzle, mais se adensam as minhas preocupações e vejo com grande nitidez a confirmação pública da podridão latente nos níveis altos do nosso poder político, económico e judicial.
A família Espírito Santo não teve, nem poderia ter a ajuda do erário público ou do Banco do Estado. É isso que explica que a família tenha falido e nós ainda não.