Valter Lemos
AS “BOAS” E AS “MÁS” ESCOLAS
Mais uma vez foram divulgados os rankings dos resultados nos exames do ensino secundário nas escolas portuguesas. E mais uma vez os títulos foram que as escolas privadas têm os primeiros lugares desse ranking. O jornal Público assumiu, há alguns anos, empenhadamente, a missão de organizar e divulgar tais rankings, no que tem sido seguido por alguns outros meios de comunicação social. Também os títulos têm sido todos os anos semelhantes, enfatizando a liderança das escolas privadas face às públicas.
Considero que diversos órgãos de comunicação social prestam um mau serviço ao seu público, à educação e às escolas. Não por divulgarem os resultados dos exames por escola, mas pela associação, explicita ou implícita, que fazem entre os mesmos e a qualidade das escolas e do ensino desenvolvido.
Os resultados nos exames dizem-nos muito pouco ou nada sobre a qualidade das escolas e do ensino. Se os resultados escolares se devessem só ao trabalho da escola, assim seria, mas, como sabemos, eles estão associados, também de forma intensa, à origem familiar dos alunos e ao respetivo capital social e cultural, para além de outras variáveis como as expetativas e as oportunidades de aprender.
Quantos alunos pobres ou provenientes de etnias socialmente marginalizadas tem o Colégio de Nossa Sra. Do Rosário ou o D. Diogo de Sousa ou o Manuel Bernardes que ficaram nos primeiros lugares dos exames? Nem sequer sabemos porque as escolas privadas não fornecem estes dados! Mas sabemos, por exemplo, que a Escola Secundária D. Filipa de Lencastre, uma das públicas mais bem classificadas só tem 6% de alunos carenciados, ou a Secundária do Restelo que só tem 4% de alunos carenciados. Faz sentido comparar os resultados destas escolas com, por exemplo, a Escola Secundária de S. Pedro da Cova em Gondomar que tem 56,4% de alunos carenciados ou a Seomara da Costa Primo na Amadora com mais de 40% de alunos carenciados?
O trabalho e a qualidade das escolas devem analisar-se através do valor educacional acrescentado e do seu contributo para o sucesso dos alunos e não simplesmente através dos resultados nos exames. Para isso foram este ano divulgados os resultados das escolas no que respeita ao número de alunos que concluiu o secundário sem reprovações e também ao progresso dos alunos em cada escola, ou seja, a diferença entre as suas notas no início do ensino secundário e as notas obtidas (com exames) no final do secundário. É isto que afinal prova o efeito da escola.
E os resultados obtidos são interessantíssimos e devem ser estudados com atenção. Ali podemos ver que o colégio Manuel Bernardes, 2º do ranking dos exames, só tem um indicador de progressão dos alunos de 5,34% e a Escola Básica e Secundária de Barroselas tem um indicador de progressão dos alunos de 33,88% (1º lugar) apesar de estar só em 374º lugar do ranking de exames. Neste ranking de progressão dos alunos há 7 públicas e 3 privadas nos dez primeiros lugares. Também no ranking dos percursos de sucesso nos dez primeiros lugares temos 6 escolas públicas e 4 privadas.
Estes dados merecem estudo e análise, não só para conhecer as escolas que mais efeito positivo têm sobre os respetivos alunos (e devem ser estas as que merecem o rótulo de “melhores escolas”), mas também as escolas que têm efeito negativo sobre os seus alunos. Na verdade, há escolas, em que não só os alunos não melhoram os resultados ao longo do percurso escolar, como até os pioram. Ou seja, em que o indicador de sucesso é negativo. Nestas a pior de todas é a escola da Maceira, Leiria, que tem um indicador de progresso negativo de -27,54%, apesar de aparecer em 4º lugar das escolas públicas (42ª do geral) no ranking dos exames!
Enfatizar o caráter privado ou público das escolas na análise dos seus resultados pode ter objetivos políticos, mas, não é, de certeza, a melhor forma de compreender os fatores que fazem uma “boa escola” ou uma “má escola”.
A escola pública foi uma enorme conquista civilizacional e muitos países e sociedades devem-lhe grande parte do seu desenvolvimento. Portugal é um desses países, onde a contribuição da escola para a mobilidade social e para o desenvolvimento socioeconómico mais se fez sentir na segunda metade do século XX. Mas, também a escola privada tem dado contributos sociais significativos em muitos países e também em Portugal. A sua coexistência tem sido positiva na resposta à diversidade social e cultural.
Mas, não é essa característica que faz das escolas “boas” ou “más”. As escolas boas são aquelas que “levam” os alunos mais longe do que seria expectável. E as “más” são as que não os levam a lado nenhum!